CAPTAÇÃO DE DOADORES

O saudoso sociólogo e portador de hemofilia: Hebert de Souza (Betinho) contava uma estória, que dizia o seguinte:

Uma floresta estava pegando fogo, e um beija-flor começou a carregar água no bico para apagá-lo, enquanto que a bicharada toda só corria de um lado para o outro, preocupados porque não iam ter onde morar.

O leão, rei da floresta, parou o beija-flor e perguntou:
- Ô beija-flor, você acha que vai conseguir apagar esse fogo sozinho?
O beija-flor prontamente respondeu:
- Não! Eu sei, mas estou apenas fazendo a minha parte!

MORAL DA HISTÓRIA
Se todos fizerem a sua parte e trabalharem em torno do mesmo objetivo será muito maior a chance de conquistá-lo.

O doador de sangue é o elemento vital para o funcionamento do Hemocentro.
Os aspectos relacionados às terapias que utilizam sangue e seus derivados, há muitos deixaram de ser problema dos médicos ou dos HOSPITAIS.
Países mais evoluídos socialmente, também há muito perceberam que este assunto está relacionado aos aspectos políticos da organização da sociedade, tais como, grau de organização dos cidadãos em entidades civis, através de clubes, de associações, dos conselhos, das igrejas, etc, ou institucionais - corporativas como são as empresas, os sindicatos, as polícias, os exércitos, as universidades e finalmente ao grau de organização do próprio ESTADO através das Políticas Públicas de Saúde Coletiva e da Participação social e consequentemente da forma de organizar a sociedade, que através da apropriação de informações passa a compreender melhor suas obrigações e direitos para finalmente tornar os cidadãos conscientes.
A própria Constituição Brasileira trata do assunto, o que demonstra o grau de importância social e econômica que envolvem esta questão.
Os conflitos de interesses que perpassam o assunto vão desde aqueles relacionados aos aspectos técnicos da coleta, armazenamento e distribuição do sangue e derivados, passando pelos aspectos econômicos, relacionados ao uso dos equipamentos e instalações, industrialização dos derivados e a cobrança dos serviços de transfusão, já que a cobrança do sangue é ilegal; até os conflitos decorrentes de questões estratégicas como são os estoques do material coletado e também os cadastros de doadores, este interesse estratégico preocupa autoridades civis em tempo de paz e os militares o tempo todo.
Uma vez que não é possível ainda substituir o sangue por um derivado sintético, este material biológico tem que ser obtido através da doação feita por um cidadão.
Todas as doações são voluntárias, mas só a minoria dos doadores tem informação suficiente para decidir soberanamente sobre o significado do seu ato de doar uma parte de si para outro cidadão. A complexidade do sistema urbano das grandes cidades exige que se explique melhor às pessoas o que significa ser doador voluntário e permanente.
“A grande maioria das pessoas só doa sangue quando alguém pede”. Essa afirmação reflete duas irresponsabilidade do sistema de saúde: a primeira está relacionada a inexistência de sangue estocado em condições de uso com segurança, é necessário tecnicamente um intervalo de dias para que o sangue coletado possa ser utilizado e todo cidadão tem direito a isto; a segunda relaciona-se ao tratamento reducionista que as instituições hospitalares dão ao assunto, transformando um problema de ordem coletiva e de interesse de toda a comunidade em uma questão individual ou familiar: a família da vítima ou paciente é transformada em agenciadora de doadores.
A emergência ou doença que provoca a necessidade de transfusão é de fato um problema individual, mas para a comunidade e para o Poder Público não é, pois de antemão todos sabemos que diariamente ocorrerão acidentes de trânsito, de trabalho, crimes, violências e cirurgias.
Um outro aspecto da questão sangue e cidadania, está relacionada às cadeias de transmissão de doenças infecciosas, principalmente as que ocorrem pelo contato sexual. Cidadãos que se tornam doadores voluntários e permanentes adquirem informações que provocam o desenvolvimento da consciência da preservação da saúde através da redução dos riscos de exposição.
Quando uma comunidade consegue cadastrar um parcela próxima de 4% de seus cidadãos como doadores voluntários e permanentes está formada uma cadeia sanitária que naturalmente se contrapõe à cadeia da transmissão, o que contribui para a redução de doenças”.
Tendo em vista estas considerações o HEMOCENTRO da Faculdade de Medicina de Marília desenvolve um trabalho que tem por objetivo levar informações e desenvolver a consciência da população e concomitantemente, organizar um sistema que possibilite o cadastramento de 4% da população de Marília como doadores voluntários e permanentes de sangue.
A principal característica deste trabalho está em utilizar os equipamentos de saúde e comunicação já existentes, sem necessidade de criar ou gastar com investimentos novos.
No Hemocentro da Faculdade de Medicina de Marília, os assistentes sociais sãos os articuladores de todo este processo. Suas atuações se concretizam à medida que conseguem mobilizar e organizar a comunidade para exercer a sua cidadania.
A obtenção de doadores voluntários, por motivação humanitária, constitui-se numa tarefa árdua e cara, impondo trabalho extensivo de educação e comunicação de massa.
Nos países mais desenvolvidos, independente dos doadores serem remunerados ou não, existe um grau de conscientização a respeito da importância da doação de sangue. Basicamente, isto deve-se à história desses povos, que sempre conviveram com situações de guerra e conflitos. Assim a necessidade faz parte de seu cotidiano e todos se mobilizam para que não falte sangue em momento algum.
A doação de sangue sempre esteve envolta numa série de fatores, tanto a nível sócio-econômico-cultural, que advêm no caso brasileiro do fato do país não ter passado por nenhuma grande guerra ou por terremotos e catástrofes que mobilizassem a sociedade a doar sangue para salvar vidas. A falta de instrução coloca-se como obstáculo para que as pessoas compreendam o significado e a importância do sangue para a recuperação do organismo e para a preservação da vida.A baixa qualidade de saúde de um povo é determinada pela má distribuição da renda, concentrada nas mãos de uma pequena minoria, pelos baixos salários, por condições sanitárias precárias e pelo baixo nível de instrução da população. Também o acesso ao mercado de trabalho se dá muitas vezes em ocupações insalubres e mal remuneradas. Este conjunto de fatores, entre outros, determina a falta de condições de higidez necessárias à doação de sangue.
Os aspectos psicológicos decorrem das fases de desenvolvimento do indivíduo, da falta de esclarecimento, e também das fantasias do imaginário popular a respeito do sangue. A disposição interna de doar sangue está intimamente ligada às fases que o indivíduo desenvolveu em seu ciclo vital.
O imaginário popular geralmente associa o sangue tanto à vida quanto à morte. Este significado ambivalente que o sangue traz consigo, apresenta-se, de uma lado, como fonte de vida e atua assim, como, elemento de autopreservação e de preservação da espécie, e, de outro lado, como, significado de morte, atuando desta forma como símbolo de agressão e destruição da vida.
Estas questões influenciam na decisão e disposição de doar sangue ou não; tendo como principais temores:
- Dependência da doação, ou seja, o indivíduo crê que o ato deverá ser repetido sempre, depois da primeira doação de sangue.
- Enfraquecimento orgânico.
- Contaminação com doenças infecto-contagiosas.
- Tabus, preconceitos populares.
- Príncipios místicos e religiosos.
- Fobia, comodismo, falta de informações.
A captação de doadores é um processo, no qual, todos os membros da comunidade deverão estar comprometidos e empenhados, pois sem o doador, não haverá em hipótese alguma disponibilidade de sangue.